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terça-feira, 9 de abril de 2013

Aqueles Que Vagam Pelo Vazio


Por: Mateus Silva Saraiva

Desde que houve a quebra da bolsa de Nova York, eu esperava tempos difíceis, mas não esperava estar nessa situação, com a loucura corroendo minha sanidade, enquanto minha consciência vaga pelo espaço vazio preso eternamente aqui. Era uma noite como as outras, estávamos no clube onde ocorrem as lutas ilegais e o tráfico, o luto pela morte de um pai ainda se mantinha. Ele era muito influente na família.

Ainda lembro-me do Peter me chamando, aquele irlandês desgraçado que fora meu amigo e acolhi como irmão. “Vicente! Um daqueles estrangeiros folgados, metidos a intelectuais da Miskatonic veio xeretar nosso clube.” Fomos então pedir gentilmente a base da bica que ele sumisse de lá, mas não é que o amarelo quis entrar no ringue com o Peter. Até a primeira vista pensei que o Peter ia cair, mas ele tomou uma surra, convenhamos que até perdi uma grana apostando errado.

Depois do fim das apostas e lutas, fomos dar um fim no rapaz, lá no beco, ele estava vivo, apenas desmaiado, apesar de termos quebrado sua perna para aprender a não xeretar em certos cantos e em seguida, a mando de Michael, tínhamos de cobrar algumas bebidas do velho Judeu maluco, dois rapazes foram no dia anterior e ainda não deram as caras, Michael acha que pegaram a grana e sumiram. Eu culpo esse desgraçado, foi aonde começou tudo. Ainda lembro-me de tudo que ocorreu naquela noite. 

Lá no final do beco, ficava a casa do Dr. Carter, um professor aposentado e colecionador de bizarrices. As luzes estavam acesas, e muito barulho podia ser ouvido, a porta parecia entre aberta. Era nossa área, então eu e o Montanha fiel amigo de infância, grande como um touro e burro como uma porta, ou talvez, apenas inocente, qual fica de segurança no clube, fomos lá dar uma olhada, enquanto Peter ficava de olho na entrada do Beco.  

A janela do segundo andar se quebrou, e foi à primeira vez que vi, ou acho que vi de relance uma daquelas criaturas, como posso ter certeza, ainda acho que tudo é apenas um pesadelo. Continuávamos a nos aproximar, empurramos a porta furtivamente, ou quase, se não fosse pelo Montanha quase arrancá-la. Então pude ver aquela estatua de pedra de mais de dois metros saindo do porão e carregando uma espécie de cilindro. Até então não entendia como uma estatua podia se mexer, disparei contra ela com minha 45, nem arranhou, Montanha que tentou investir contra o ser foi arremessado longe. Jamais vi algo com tanta força para conseguir arremessar o Montanha, assim, como se não fosse nada.

Ele caiu chorando de medo no chão, o ser caminhava em minha direção, eu simplesmente sai de seu caminho, e no alto da escadaria pude ver o professor morto, esmagado. Aquele ser não parecia se importar muito conosco, simplesmente saiu pela porta, pude escutar o grito desesperado do Peter. Depois de ajudar ao Montanha levantar, o coitado estava desesperado, nunca tivera levado tamanha surra. Fomos lá fora ver se estava tudo bem com o Peter.

Lá fora depois do beco, havia uma das botas do Peter enroscada em um bueiro, indicando ao que parece que ele caiu enquanto corria na direção oposta que a criatura de pedra seguiu, esta foi ao norte. Nós sabíamos que Peter sabia se cuidar, então nós demos uma volta no quarteirão, para ver se o encontrávamos, e vimos ele sendo parado pela policia lá ao longe, então decidimos deixar para lá toda essa loucura, e Peter resolver os problemas e seguir para mansão do judeu maluco, como era conhecido Ephraim na cidade. Preferia fingir que nada aconteceu, aquilo era o tipo de coisa bizarra demais, e que ninguém acreditaria em nós ou nos trancariam em um sanatório. Ainda mais com as estranhas luzes no céu aquela noite.

Sobre aquele velho judeu, o povo da cidade contava que havia ficado doido e abandonado o sacerdócio na sinagoga depois que sua mulher morreu ao dar a luz, e que sua filha, poucas vezes vista, era bonita, mas muito esquisita, meio que não batia bem da cachola como o pai. Já era meia noite, paramos o carro, e fomos bater no portão principal da Mansão. Não demorou para que sua filha abrisse a porta da mansão, trajando uma camisola de seda branca quase transparente, e foi caminhando como um ninfa grega, ainda que um pouco desajeitada, pelo pátio entre as árvores do jardim até o portão principal.

 Nós a cumprimentamos, sem resposta, meu Deus como as imagens nos iludem, e isso me dá calafrios agora, apesar de agora mal sentir meu corpo. Ela parecia tão bonita, pele pálida sob o luar, olhos grandes e tão claros que pareciam brilhar, cabelos loiros semi ondulados, um corpo sedutor, não devia ter nem vinte anos. Eu como sempre um galanteador, logo dei uma piscadela para ela, pelo menos isso ela correspondeu com um sorriso, e um sinal para entrarmos após destrancar o portão.

Seguimos, era tão sombrio aquele jardim, um jardineiro não cuidava daquele lugar há anos. Na porta Shalomo Ephraim nos recebeu com educação. Já vestia o pijama de dormir, coberto com um sobretudo. Perguntei sobre os dois garotos que foram levar bebidas para ele ontem, ele então nos convidou a entrar e tomar um whisky, e conversarmos sentados, mais relaxados. A casa dele dava arrepios, cheio de coisas estranhas e símbolos, mas o sofá era confortável.  

Ele pediu que aguardássemos, enquanto ia buscar a bebida, pedindo para a filha dele ficar conosco. Não podia perder esta oportunidade, logo olhei para ela, ela entendeu, e fez um sinal para que fosse com ela. Pedi que Montanha esperasse por mim, e enrolasse o judeu até eu voltar. Nunca fui de dispensar um belo rabo de saia.

Nós fomos até um quarto nos fundos, era escuro, parecia mais uma dispensa, sem moveis. Ela não abria a boca para me beijar, e nem deixava tocar em sua pélvis, sua pele era muito gelada, mas o que deveria pensar, a noite estava fria mesmo, juro que podia escutar ela fazendo alguns sons estranhos, e como ela estava sem roupas de baixo, bom logo aprovei, arriei as calças, e quando coloquei... Meu deus! Droga, como? Isso me dá náuseas só de lembrar. Era gelado e parecia que estava enfiando em um balde de cheio de minhocas ou larvas, e algo lá dentro dela tentou me agarrar, me cortar.

Isso é nojento, não acredito, eu que sempre fui um mulherengo acho que nunca mais chegarei perto de uma mulher novamente. Logo que percebi aquela coisa estranha, pulei para traz, e saquei a arma, havia algo mais enroscado em minhas mãos, em mim. Era sua pele, que descolou do seu corpo quando no súbito ato do reflexo, pulei para trás. E então como parte da pele que cobria aquilo que fora uma bela mulher se desfazendo em cima de mim, pude ver a silhueta de um horrível ser, parecia ter asas e ia rasgando a pele enquanto tentava me agarrar com pinças como aquelas de insetos ou crustáceos, onde fora suas mãos, e imitindo um som como de insetos.

No desespero só podia atirar, enquanto a criatura tentava me empurrar para outra porta que parecia dar para um porão. Certas vezes, aquilo que deveria ser sua cabeça acendia uma estranha luz fosforescente que me mostrou como ela era, de coloração rosada, com um pouco mais de metro e meio, seu corpo lembrava um crustáceo, com uma par de barbatanas dorsais, e asas membranosas, diversas patas articuladas que terminavam em pinças, aquilo que deveria ser sua cabeça tinha formato elipsoide e era um emaranhados do que pareciam antenas curtas. Ah droga, como pude transar com isso? Acho se pudesse vomitaria só de lembrar.

As minhas balas pareciam que não a machucavam, até que apesar de sua força, consegui empurrá-la para o tal porão, onde ela tentara me atirar, e fechar a porta. Saí desesperado. Só que a casa estava toda diferente, parecia um labirinto, paredes e portas aonde não havia antes. O que estava acontecendo? Quando em um pequeno lapso, pude ver que ao mesmo tempo, em que em um determinado lugar que parecia ter uma parede sem aberturas também tinha uma janela, então, que se dane, no meio dessa loucura resolvi saltar por ela ou bater na parede.

Caí no jardim da mansão, pude ver entre as árvores, o Montanha saindo do portão para fora, mas estava comigo!? Mas como assim, como eu estava lá, sendo que eu não estava? Maldito pesadelo que não acabou aquele momento e ainda persiste. Eu estava sem fôlego para gritar, minha voz mal saia entre minta tentativa de respirar, estava confuso demais. Ao tentar me levantar, vi o chapéu do Billyboy entre os arbustos, era um dos garotos. Puxei ele, infelizmente ele estava morto, e muito ferido, aquele maldito judeu, o que fez com ele!

Foi então que eu escutei grunhidos vindo do Billyboy, ah ele parecia vivo, fui ajudá-lo. O desgraçado me agarrou pelos braços e tentou me morder, e o grito desesperado não consegui segurar, quando puxei ele dos arbustos, e só tinha metade de seu corpo, com as vísceras e tripas se enroscando nos arbustos, e mesmo assim ainda estava vivo. Pelo menos assim o Montanha ouviu meus gritos e correu para me acudir e não vinha sozinho, Peter estava com ele.

Logo que chegou, sua primeira expressão antes mesmo de me ajudar foi:

-Oras chefe, você estava do meu lado como veio parar aqui?

-Esquece isso e tira essa coisa de cima de mim! – Gritei.

Enquanto Montanha puxava a metade do garoto, Peter pegou suas facas com tremenda destreza e desferiu golpes até cortar o braço do morto-vivo.  Foi preciso o Montanha esmagar-lhe a cabeça com uma pedra para parar. Porém, nesse instante outro pulou em cima das costas de meu amigo grandalhão, era o outro garoto que acompanhava o Billyboy e começou a morde-lhe. Ele com toda raiva corria e se batia contra a parede para criatura soltá-lo. Até que neste mesmo momento as portas da mansão se abriram e uma gigantesca mão retirou o morto-vivo das costas dele, e esmagou seu crânio sem esforço, era novamente aquela estatua de pedra ambulante, e ao seu lado estava o desgraçado Ephraim.

Apavorados, Montanha e Peter, tentaram sair correndo em direção ao portão de saída, que sem ninguém tocá-lo começava a se fechar. Em palavras estranhas e gestos manuais, podia jurar que aquele judeu deu vida e movimento as planta que começaram a tentar segurar os meus dois amigos, sem sucesso no caso do Montanha que era muito forte e consegui fugir antes do portão se fechar. Enquanto isso, apontei minha arma para Ephraim, e perguntei:

-O que esta fazendo conosco seu verme! Vou estourar sua cabeça.

-Se estourar minha cabeça, nunca saíram daqui, e o golem vós matara. Respondeu tranquilamente o judeu, enquanto eu continuava a ameaçá-lo, e continuou.

-Eu posso ajudá-los se me ajudarem. Não tem ideia do que tu fizeste com aquela criatura, o que ela é, será mais seguro se conversarmos lá dentro, prometo que explicarei tudo.

Nesse momento pude ver aquele ser que enfrentei lá dentro sair por uma janela, voando desajeitado, carregando um cilindro, idêntico ao que o tal do golem estava. Ele insistiu para entrarmos logo, Peter estava emaranhado nas relvas tentado pular o portão sem sucesso. O convenci que deveria vir comigo apesar de meu grande receio em entrar lá novamente, eu sempre o ajudei desde que veio a este país, então ele me devia. Quando resolveu se acalmar e vir comigo, as plantas simplesmente o soltaram em um passe de mágica.

Dentro da mansão ele começou a contar sua sombria história. Sua mulher e filha morreram no parto há quase trinta anos atrás. Ele não entendia porque Deus havia tirado seus amores de sua vida, então começou a buscar um meio de preservar os corpos e trazê-los novamente a vida. A princípio se deparou com a criação do golem, lendo os antigos manuscritos, uns de tais Sepher Yetizirah e Zohar, mas era um ser burro demais e que não poderia ser habitado por uma alma, uma estátua feita sob certos rituais e com um nome divino na testa, criação que ele se dispôs a tentar enquanto prosseguia com seus estudos.

Não demorou para se deparar com os tomos de necromancia e ciências ocultas, mas não queria que sua família voltassem como meros zumbis, a consciência e o cérebro tinham de ser preservados, então em livros tão misteriosos como as estrelas do céu, encontrou relatos de uma raça vinda de um mundo chamado Yoggoth, chamados de Mi-go e podiam preservar os cérebros humanos e sua consciência em uma espécie de cilindro, então conseguiu um meio de contatá-los por estranhos rituais.

Para seu horror teve sucesso, e fez um acordo com os seres do outro mundo, os corpos de sua mulher e filha que até então permaneceram congelados com ajuda de um tal Dr. West, com o qual tinha um acordo, tiveram os cérebros arrancados e preservados, em troca ele comprou um terreno de uma antiga pedreira aos arredores da cidade aonde havia uma colônia dessas criaturas, e então passou a de certo modo protegê-las, e um daqueles seres literalmente vestiu uma pele humana, para manter contato com ele, na realidade vigiá-lo, e ali viveu sob aspecto de sua filha morta. Shalomo Ephraim acabara se tornando um fantoche de seus próprios demônios.

Enquanto isso financiava as pesquisas do Dr. West, qual tentava vencer a morte pela ciência, e manter o corpo e a consciência vivos e intactos. Sempre tendo péssimos resultados, muitas vezes por puro sadismo criando aberrações, muitas dessas aprisionadas no velho galpão da pedreira. Por fim ele percebeu que só estava sendo usado por ambos os lados.

E recentemente um aventureiro, agora falecido, havia conseguido adentrar a pedreira e roubar um dos cilindros dos Mi-Go, quais falaram que era para ele dar um jeito de recuperar, pois neste estava o cérebro de sua esposa. E nesse momento inapropriado foi quando os garotos estiveram na mansão para entregar as bebidas, e foram mortos por tais monstros alienígenas. No seu desespero pediu que o Dr. West os revivesse, enquanto buscava pistas sobre onde estava o cilindro. Logo soube que foi adquirido pelo professor e colecionador de antiguidades, o senhor Carter. E mandou o golem na surdina da noite recuperar o cilindro, por bem ou por mal.

Mas no final das contas aquele não era o cérebro de sua mulher, era um outro qualquer. As criaturas mais uma vez o tinham manipulado. E nós tivemos a infelicidade de chegarmos no momento errado. E por sabermos de sua existência as criaturas iriam nos perseguir e nos matar, deveríamos nos esconder lá aquela noite, pois na mansão havia um cômodo secreto, e lá fora elas iriam nos perseguir. E que nossa única chance era explodir aquela antiga pedreira, e que isso seria um favor para ele também.

Enquanto nos contava estas histórias, nos trouxe seus livros arcanos, que Peter foliava. Até que por fim Ephraim encerrou dizendo: “Deus não existe, e esta cruz que carrega no peito senhor Peter é inútil, Jesus é apenas uma blasfêmia aos Antigos.” 

Podia ver que Peter um fanático religioso, católico, não estava nada bem, podia jurar que seus olhos estavam lacrimejando, ele estava falando sozinho, que não era possível, que nada daquilo era possível. Entre rezas e suspiros, podia dizer que aquele era o princípio da sua insanidade, para mim ainda era o princípio de meu pesadelo. Como aquele tal golem poderia ter nos esmagado, julguei que apesar de louco, o judeu falava a verdade, e aceitei sua oferta de esconderijo. Arrastando Peter comigo, que estava extremamente nervoso e não gostou nada da minha ideia.

No andar superior havia uma porta atrás de um armário, lá não havia janela, tinham alguns coxões e água. Parecia mais como uma prisão, porém, arriscamos. Do lado de fora a porta foi bloqueada novamente pelo armário. Exausto antes de pegar no sono, perguntei ao Peter como ele tinha se livrado da policia antes, e se acreditava em toda aquela loucura. Ele respondeu que deu um jeito com a velha e boa mentira, Peter sempre foi labioso, e que não sabia mais em que acreditar, só esperava acordar daquele pesadelo. Pude ouvi-lo rezando antes de apagar no sono.

Mal havíamos apagado, quando barulhos súbitos nos despertaram, pude escutar dois tiros pelo menos, e o barulho que era claramente o armário caindo. Esperamos um pouco e foi então que nos preparamos para sair, tivermos então de arrombar a porta, lá fora vários moveis estavam destruídos, uma luta aconteceu ali, descendo as escadas, o caos era ainda maior, no chão se estendiam várias massas gosmentas e borbulhantes, exalando um forte cheiro, entre a massa pude identificar aquelas “pinças”. Não havia nenhum sinal do golem ou do judeu. Então seguimos em direção aquele porão, no caminho tropecei em uma espingarda e naqueles velhos livros, provavelmente do judeu, os quais apanhei.

Observando com cuidado, podíamos ver que tinha alguma coisa lá em baixo, escondemos na sala externa a que levaria o porão, quando uma daquelas criaturas crustáceas aladas saiu do porão voando pela janela. Seguimos  em direção ao porão, mas algo mais subia pelas escadas. Nós preparamos para atacar o que quer que fosse aqui, que aberração, duas criaturas bípedes, aberrações de uma mistura cirúrgica de partes humanas com partes animais, aparentemente de cachorro ou bode. Felizmente conseguimos pegá-las desprevenidas, e desmembrar seu corpo, mas ainda assim, os membros separados continuavam a se mover. Ao descer do porão, nos deparamos com um laboratório, e entre diversas jaulas, em uma a parte, havia uma mulher amarrada em uma maca, desmaiada, e na maca ao lado dela, um estranho corpo humanoide com o cérebro retirado.

Eu ajudei a mulher, com receio que ela podia ser mais uma daquelas criaturas, as vezes acho que depois do acontecido, adquiri um pavor de mulheres. Enquanto isso, Peter remexia algumas notas daquele que estavam lá no laboratório, eram registros das experiências e aprendizados que o tal Dr. West fizera junto ao que como descreveu nas notas “fungos de Yoggoth”, uma referência aos tais Mi-Go. A mulher seria mais uma das suas experiências, ela deveria receber o cérebro do que erroneamente acreditavam ser a antiga esposa do judeu. Quando a mulher acordou, estava desesperada, mas consegui acalmá-la.

Seu nome era Carolline, uma média do Hospital da cidade, em uma proposta de encontro junto ao Dr. West, ele a segou, e disse alucinar, assistindo o doutor conversar com estranhas monstruosidades crustáceas naquele laboratório. Pude ver o terror tomá-la, quando disse que não foi uma alucinação, mas apenas não havia adormecido. E que mesmo em pavor, precisávamos sair dali o quanto antes. Ao sair do porão, podemos ouvir os barulhos da sirene da policia. O único jeito era sair pelos fundos, ou fazer a mulher de refém, afinal, quem acreditaria na história que tínhamos para contar. Pelo menos a médica estava grata por temos a salvo, e cooperou conosco.

Saímos pelos fundos, mas logo na rua de trás, demos de cara com um carro de policia. Por sorte era o Thomas sozinho, um policial, que digamos sempre colaborou conosco. Ele ajudou a mulher, enquanto deixou eu e Peter irmos, e que no dia seguinte aparecia no clube para acertar o preço da nossa liberdade. O Peter foi direto para clube, enquanto eu fui para minha casa, mas a pé, lembrei de um grave erro, meu carro ficou para trás, e sabia que isso daria problemas.

Logo de manhã, acordei com a batida da policia na minha casa, por sorte já esperava por isso, e então consegui fugir, fui direto ao clube. Lá fui recebido pelo velho Joe, o zelador do lugar, ele mencionou um fato que me deixou preocupado, Peter não havia chegado de madrugada, e ele dormia nos fundos do Clube. O cansaço era tanto que fui descansar apesar das preocupações. Fui então acordado logo após o almoço pelo Montanha, que estava preocupado por ter sido mordido por aquele morto-vivo e antigo companheiro, e  que não entendia o que havia acontecido naquela mansão na noite anterior. Nunca o vi tão desesperado assim, como uma criança ele esperava que tudo fora apenas um pesadelo, e nada mais.

Joe avisou que devido as circunstância e ações policiais o clube ficaria fechado por uns dias, e que provavelmente Michael, viria conversar comigo talvez naquela mesma noite, e também me mostrando as noticias do jornal. Eu estava lá entre a misteriosa morte do professor Carter, e estranhas luzes que tinham sido vistas no céu daquela madruga, noticia onde eu era o principal suspeito do desaparecimento do judeu Ephraim e dos corpos encontrados mutilados na mansão. Talvez o menor dos problemas, seria eu resolver isso ao considerar as criaturas que rodeavam nossa cidade.

No crepúsculo o Peter chegou, ele estava estranho, um olhar vazio seguia no semblante de sua face. Ao questioná-lo, mencionou que havia ido à igreja, seguindo direto para seu quarto, de onde saiu apenas quando Michael chegou algumas poucas horas depois dele. Acompanhado de dois dos seus mais fieis homens, com uma voz ironicamente calma, intimou ao Peter e a mim, para sentarmos a mesa dos fundos, onde conversaríamos sobre toda aquela zona da noite anterior:

-Quem você pensa que é Vincent!? Nada mais que um bastardo inconsequente!  Uma vergonha para família! Seu pai estaria cuspiria em você, se ainda ele vivesse! – Gritou Michael entre inúmeras palavras mais, até ser interrompido por Peter, que se pronunciou com uma incrível convicção:

 -Fala aquele que matou o próprio irmão! Um verme pior que próprio Caim que a sangue frio matou Abel! Eu sei bem que você o envenenava todos estes anos, pela inveja do seu posto na máfia!

Palavras que jamais imaginava que viriam dele, histórias que no fundo acreditava naquele momento, mas não conhecia, e como ele poderia saber disso? Logo a reação e o olhar espantado de Michael provaram que tais palavras eram verídicas, e antes que ele e seus homens tomassem alguma reação, ou mesmo ele falasse algo, saquei a arma e atirei na cabeça do Michael, e praticamente ao mesmo tempo tomando a mesa na direção dos seus capangas, que não demoraram a disparar em mim. Peter parecia saber o que aconteceria, e enquanto a mesa tombava no chão, ele já pulou ao lado preparando suas facas e investindo em um dos capangas que começara a disparar em mim, com um golpe certeiro na garganta.

Antes que o outro capanga atirasse nele, conseguiu virar o corpo daquele individuo na direção de seu parceiro, usando-o como um escudo contra aos tiros que então a ele seriam disparados. Uma ótima oportunidade, mesmo estando ferido, que consegui para acertar aquele maldito e abatê-lo antes que ferisse o Peter. Joe logo veio com sua espingarda, e felizmente não atirou em nós já que eu mesmo não tinha mais balas, e declarou nunca ter gostado do Michael mesmo. Eu tinha levado três tiros, dois na perna direita e um entre a barriga e o peito, e sabia que não poderia ir ao hospital sem ser preso, mas é nesses momentos que o destino sorri com um sarcasmo aqueles afortunados sem sorte.

Alguns minutos depois do acontecido, enquanto Peter e Montanha tentavam me ajudar, o policial Thomas veio cumprir sua visita como prometido, e logo que me viu e toda aquela baderna exclamou:
 
-Cadê meu dinheiro velho amigo! Precisa me pagar bem antes de morrer, ainda mais se quer que eu ajude seus camaradas a limparem essa bagunça.

Resumidamente tentamos esclarecer tudo que aconteceu desde a mansão, aos problemas de “família”. Obviamente ele não acreditou muito, só não se duvidou mais dos problemas relativos à questão da máfia e do tráfico ou das aberrações na Mansão. Mas logo se propôs a buscar aquela médica que havíamos resgatado na madrugada anterior daquela mansão, para me ajudar com meus ferimentos. Afinal ele queria seu pagamento, como um bom policial corrupto, a maioria deles é assim mesmo caso não saiba. Agora após disso não lembro muito do que aconteceu, pois desmaiei, mas lembro de um pesado, qual me atormentou pelos dois dias que permaneci desacordado.

Tal pesadelo, às vezes ainda o tenho. Ah! Era um dos bordeis mais caros da cidade de Arkham, com as mais lindas garotas me esperando em um quarto só para mim, eram pela menos meia dúzia delas, as minhas favoritas, aliás, bebida no móvel de canto e boa música na vitrola, mas de repente quando elas se deitavam comigo e sobre mim, suas peles se rasgavam, e de dentro de sua carne saiam àquelas criaturas crustáceas monstruosas. E em meio a gritos silenciosos, eles me prendiam, me cortavam, arrancavam os meus órgãos, e os lençóis de seda rosada se manchavam ao carmim do sangue, enquanto podia assistir tudo, até finalmente abrirem minha cabeça.

Foi então que acordei, ainda era de tarde, o Peter e a médica estavam do meu lado na cama do clube. Peter mencionou que ele junto do Thomas, foram deixar o carro do Michael, junto com o mesmo e seus capangas nas imediações daquela pedreira, já que precisavam dar um fim neles mesmo.  E então depois do que o policial viu naquele galpão, não hesitou mais em duvidar das nossas histórias, providenciando no dia seguinte algumas dinamites para nós, e uma ação policial que estaria sendo realizada no momento dessa conversa. A médica concluiu que o tal Dr. West havia sumido da cidade, em uma viagem para ninguém sabe aonde.

Ela estava ansiosa para ver mais dessas coisas, demonstrando uma curiosidade mórbida pelas cirurgias bizarras e as outras demais monstruosidades que nós deparamos, diria que aquela médica era louca, ou talvez tenha ficado depois de tudo que passou. E como queria dar um fim em tudo isso logo, para poder ver meus pesadelos terem fim, pensei que ela poderia ser útil, e seguir comigo, Montanha e Peter para pedreira na velha caminhonete do Joe. Mesmo incapacitado pela dor e os ferimentos, peguei a espingarda do judeu, enquanto o Peter se atentou em pegar apenas os livros do velho, ele mal sabia ler, cada vez me parecia mais estranho, enquanto o Montanha ia carregando a traseira da caminhonete com as dinamites que a nós foram arranjadas.

   No caminho Peter pronunciava estranhas blasfêmias, quais supostamente leu naqueles livros, inclusive o meio de derrubar o golem, caso nós defrontássemos novamente, e consistia em simplesmente conseguir apagar o tal nome místico de sua testa. Aquele homem não parecia mais ser meu amigo, e houve momentos que temi que um daqueles seres alienígenas monstruosos havia entrado em seu corpo, mas se fosse assim, porque ia se empenhar tanto em destruí-los? Quase chegando ao nosso destino, avistamos uma viatura da policia tombada na estrada, que chamou nossa atenção, paramos para ver, e lá dentro dele estava Thomas inconsciente e com sua submetralhadora Thompsom do lado, enquanto uma massa de carne e sangue cobria parte da frente do veículo.

Montanha o levantou e o colocou na traseira da caminhonete, junto dele. Não podíamos demorar mais, pois logo a noite ia cair, e as coisas ficariam muito ruins para nosso objetivo. Então seguindo o caminho tivemos o desagradável encontro com algumas poucas daquelas aberrações monstruosas, alguns apenas mortos vivos decrépitos, outros, misturas cirúrgicas entre animais e homens. Cobre os menores conseguíamos passar por cima, já os maiores tínhamos de desviar. Chegando ao destino as portas do galpão estavam abertas, e aqueles monstros mortos viventes devoravam restos de policiais, próximos a uma viatura com as portas escancaradas. Enquanto atropelávamos algumas, montanha logo saiu da caminhonete e pegou seu porrete, que há muitos anos tinha tomado de um policial e foi esmagando as criaturas com porradas.

Logo Thomas acordou e passou a nos ajudar, enquanto contava que tentou fugir depois de arrombarem o galpão e desesperados pelos horrores encontrados lá, perderam o controle da situação. Depois da maioria das criaturas incapacitadas, mesmo considerando que seus membros se moviam freneticamente e sem rumo ao serem separados do resto do corpo, pegamos então um galão de gasolina da caminhonete, e um da viatura, e começamos a espalhar no galpão. O terror lá dentro era inominável, não posso descrever aqui as abominações criadas pela mente de um cirurgião louco, que lá se encontravam. Foi então que, enquanto a médica olhava de perto aquelas aberrações criadas por mãos humanas, algumas dela arrebentaram o cárcere que as prendiam, e agarraram a Carolline, saindo ainda aos montes de lá.

Eu que estava mais próximo, não pude fazer nada por ela, a não ser escutar seus agonizantes gritos, enquanto fugia mancando e os outros atiravam fogo no local, qual se acendeu em chamas, antes mesmo de sairmos de lá. E eu pude ver seu corpo queimando junto das criaturas que se amontoavam sobre ela, e ainda me lembro dos seus gritos acima dos sons e grunhidos agonizantes que aquelas abominações produziam. Meu Deus! Posso ouvi-los agora! Esse pesadelo nunca termina. O sol ia se pondo no horizonte, e foi quando escutamos um barulho no porta-malas da viatura, qual o Montanha foi forçar a abertura, pois estava emperrado.

Ao abrir, vi a cabeça de meu amigo sendo estourada por um maldito policial que se escondia lá dentro, e estava enlouquecido, atirando para todos os lados e berrando, tentamos atirar nele em vão, enquanto se levantava freneticamente numa corrida em direção que o levava a entrada da pedreira. E na escuridão daquele umbral da pedreira, ao entrar lá, os berros e tiros se cessaram em um último grito seguido de barulhos de ossos sendo quebrados e esmagados. O corpo disforme e esmagado do policial então fora arremessado de lá de dentro a uma longa distância, próxima a nós, e aquela gigantesca silhueta se apresentou, era o golem que avançava sobre nós.

Nossos tiros eram inúteis, mesmo da espingarda, uma aproximação poderia ser fatal, foi quando tive a idéia de pegar uma dinamite, amarrá-la em uma corta a qual esticamos, e começamos a correr em volta do golem a uma distância segura, aproveitando que não era muito rápido. Ela então se enrolava nele, e no momento certo acendi e saímos correndo, enquanto a dinamite amarrada a corda se emaranhavam cada vez mais ao golem. Ela então explodiu, arrancando uma das pernas daquele ser de pedra, fazendo-o cair e ficar a nossa altura. Oportunidade que Peter aproveitou para apagar o nome em sua testa, como havia mencionado. Ao se aproximar do ser de pedra, pensei que seria seu fim, mas realmente ao apagar aquelas inscrições, ele simplesmente deixou de se mexer.

Agora precisávamos ir até o fim, seguir na escuridão daquela caverna. Pegamos as dinamites e o fio e fomos. Depois de nos aprofundarmos lá, começamos a espalhar as dinamites, mas logo encontramos os primeiros Mi-Go que conseguimos abater rapidamente. Foi então que chegamos aquela imensa câmara de pedra, com um estranho e imenso maquinário que não é do nosso mundo, no centro uma forma cúbica de cor de cristal, com cerca de uns sete metros chamava a atenção. Porém logo percebi que Peter não estava mais comigo e Thomas, e dezenas de Mi-Gos nós sobrevoavam naquela câmara, foi enquanto quando me preparava para deixar uma dinamite naquela maquina cúbica gigantesca que eles me viram.

Thomas desesperadamente tentou atirar em vários, enquanto um deles me atingiu com uma espécie de descarga elétrica a partir de uma pequena maquina que caberia na palma da mão, e o monstro segurava em uma de suas pinças, que fez meus músculos contraírem, me derrubando imóvel. E enquanto era arrastado por aqueles monstros, vi um dele dar um rasante onde agarrou Thomas, e ao chegar ao alto da câmara atira-lo lá de cima. Já estava próximo a maquina cúbica, e o estranho zunido de seu vibrar, impediu de escutar os gritos de Thomas, eles me arrastaram então para uma espécie de sala aparte, que de certo modo até lembrava uma espécie de laboratório de um hospital.

Lá me colocaram em uma espécie de maca, onde me amarram. Eu podia ver tudo, mas nem mesmo conseguia gritar, três daqueles monstros se ocupavam de mim, tinha a esperança de pelo menos o Peter conseguiu explodir tudo aquilo, pois pelo menos assim, todo aquele sofrimento valeria a pena. Olhei pro lado e escutei uma maquina emitindo alguns lamentos em algum idioma humano, era Ephraim o judeu, mas ele era apenas um rosto fantasmagórico projetado como nas telas do cinema, só que em uma estranha maquina, que lamentava entre o inglês e o hebraico:

-Estou preso aqui para sempre, eles me controlam, é tudo tão vazio! E quando aqui desperto, há apenas dor e pesadelo. Yahveh! Mate-me! Deixe-me morrer! Por favor, por favor! (Então seguia em outro idioma).

Então reparei em dezenas de cilindros sobre prateleiras de pedra, e a pele do judeu dependurada como um terno no cabide, e nesse mesmo instante um dos Mi-Go pegou uma espécie de cerra giratória e começou a cortar meu crânio. A dor! Esta dor ainda posso sentir! O sangue escorrendo por minha face, e era incrível sua destreza e minuciosidade em não ferirem meu cérebro. E em um último olhar para saída daquela sala, vi Peter passando pela entrada, os Mi-Gos nem se importavam com ele, e ele me encarou friamente, olhando profundamente em meus olhos, foi então que pude ver que no final das contas, ele tinha me abandonado e se juntado a eles, substituindo o lugar dos seus antigos ajudantes humanos.

O que aconteceu mais, eu não sei, essas foram as últimas coisas que me lembro. Fora quando me ligaram a esta maquina pela última vez, e só sei que aquele lugar não era a Terra, ou nosso mundo.  Mas agora imploro, quando desligarem essa maquina, destruam o cilindro, me deixem morrer, pois quando ligada só vivo um pesadelo e quando fora dela, sou apenas uma consciência vagando pelo vazio.




2 comentários:

  1. caramba em... perfeito.. jogamos isso e foi realmente muito bom, tão bom quanto o texto. obrigado mateus pelo belo texto. esse eu vou guardar com muito carinho

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  2. Nossa queria ter jogado essa história! Boa demais!

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